Depois da chuva, o arco-íris: como a Parada de Luta LGBT é uma das maiores manifestações políticas do Oeste Catarinense

Por Marina Pessalli Favero

Durante 364 dias em um ano, lésbicas, gays, bissexuais, pansexuais, transgêneros, transexuais, não-binários e demais pessoas com identidades de gênero e sexualidades que fogem do convencional andam pelas ruas da região Oeste com medo de se expressar livremente. São inúmeros casos diários de homofobia, que manifestam-se em assédios, humilhações, agressões e riscos de homicídio – como o caso da casa de shows O11ze, que sofreu um atentado homofóbico em 2017, na cidade de Chapecó.

Mas nos últimos três anos, as ruas são pintadas de arco-íris e a comunidade LGBT pode mostrar suas cores com orgulho. Trata-se da Parada LGBT, que vêm sendo organizada desde 2016 pela União Nacional LGBT (UNA) e é o único evento dessa magnitude na região. Em 2018, a 3ª Parada de Luta LGBT do Oeste teve como tema “Nossas Cores pela Democracia”, e reuniu caravanas dos três estados do Sul brasileiro no domingo (10 de junho).

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Quem mantém o preconceito de que a comunidade LGBT é promíscua, claramente nunca esteve diante de um evento como este. Em poucos minutos após as 15h, a Praça Coronel Bertaso encheu-se de manifestações de amor e individualidade. Em dia de Parada, ninguém tem medo de pintar o rosto, usar glitter, se vestir da forma mais estilosa e colorida possível, dançar, beijar e abraçar amigos e amores. “Ser feliz incomoda” – era uma das frases declamadas em cima do carro de som que guiou a caminhada – “então vamos ser muito felizes!”

Juntos, nos fortalecemos

As mais fascinantes obras de arte transformadas em maquiagem estampavam os rostos dos participantes da Parada LGBT. O evento contou com apresentações de drag queens, que nas ruas e nas dependências do Cubo Espaço Multicultural, mostraram seus talentos em dança, performance, além de se expressarem  política e socialmente. De acordo com a presidenta da UNA LGBT de Chapecó, Karla Muniz, momentos como esse “são a representação da força,  luta e visibilidade de toda uma população que sofre por falta de reconhecimento e necessidades básicas, como saúde, educação, segurança e respeito. A Parada serve para mostrar para a sociedade que não estamos sozinhos e existimos.”

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A Parada do Orgulho LGBT trata-se de um evento que está presente no mundo todo e pretende mostrar o orgulho e a cultura da Comunidade LGBT, além de representar a luta pelo fim da homofobia e conquista de direitos iguais para todos os seres humanos, independente de gênero ou orientação afetiva. Esses eventos acontecem por volta de junho para marcar a Rebelião de Stonewall, considerada como o momento histórico que desencadeou a militância por direitos iguais nos Estados Unidos. Na época – 28 de junho de 1969 – um grupo de policiais invadiu o Stonewall Inn, bar gay localizado em Nova York. A agressividade dos oficiais desencadeou uma série de protestos, que resultou em organizações ativistas espalhadas por todo o país, e posteriormente, para o mundo. Até que, em 1970, iniciam as Paradas de Orgulho LGBT.

Sobre a história de Stonewall, vale destacar uma personagem chave no movimento. A ativista, drag queen e transexual Marsha P. Johnson esteve à frente da Rebelião, e tornou-se uma figura fundamental da luta LGBT nos Estados Unidos. Em 1992, seu corpo foi encontrado boiando no Rio Hudson, morte que foi considerada suicídio, mesmo após o relato de ameaças (nunca investigadas) contra ela. A história de Marsha é contada no documentário The Death and Life of Marsha P. Johnson, disponível na Netflix.

O Brasil é sede da maior Parada LGBT do mundo, que acontece anualmente em São Paulo. Ela é realizada desde junho de 1997, e de acordo com a SPTuris (empresa estatal de turismo), é o evento que atrai mais turistas à cidade de São Paulo. O evento reúne artistas, trios elétricos, ativistas e atrações nacionais e internacionais. Mesmo com a greve dos caminhoneiros, que afetou a logística de transporte no país inteiro, o evento reuniu três milhões de pessoas.

Importante lembrar: Por mais que o Movimento LGBT tenha evoluído e conquistado diversos avanços, relações homossexuais são consideradas crimes em 72 países. Inclusive na Rússia, país que sedia a Copa do Mundo e proibiu, em 2012, que Paradas LGBT sejam realizadas na cidade de Moscou pelos próximos 100 anos.

O poder de transformação no Oeste

Nos últimos três anos de realização da Parada LGBT, a UNA tem consolidado-se cada vez mais enquanto movimento social. Karla afirma que esse fato ficou visível conforme o movimento foi ganhando mais espaços, estando presentes em uma secretaria municipal, o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (CMDM). Conquistando mais representatividade política e social, LGBTs são cada vez mais respeitados, abrindo portas para o mercado de trabalho, espaços que anteriormente só eram ocupados por pessoas heteronormativas.

Em Xanxerê, município vizinho que também possui representação da UNA LGBT, os impactos também são visíveis. “Em três anos conseguimos unificar as pessoas LGBTs, conseguimos canalizar a luta e nos fazer ouvir, conseguimos chegar em diversos lugares. Em Xanxerê, por exemplo, já tive relatos de pessoas que conseguiram conciliar-se com a família, conversar com os pais sobre a orientação sexual ou a identidade de gênero graças a UNA, graças às nossas campanhas de conscientização e isso é muito gratificante, o valor disso é incomensurável”, reflete o presidente municipal da UNA Xanxerê e secretário do movimento em âmbito estadual, Mario Harres.

Além disso, os líderes do movimento têm estado presentes em instituições de conhecimento, como universidades e escolas. “Saber que nossa luta não é em vão, que apesar dos esforços e lentidão de um governo que não faz nada pelas minorias, é bom demais. Ver a alegria no rosto das pessoas e saber que não precisam mais se esconder devido ao preconceito imposto por uma sociedade retrógrada”, finaliza Karla.

“O fervo também é luta”

A Parada LGBT é um momento em que a UNA sumariza todas as ações desenvolvidas por ela durante o ano – festas, exibições de cinema, palestras, cursos de formação, entre outros momentos de reflexão e debate fundamentais. É também uma forma de ocupar espaços públicos, e encher as ruas chapecoenses – que diariamente são testemunhas de atos machistas, racistas e homofóbicos – de amor, aceitação e respeito. “Nós costumamos dizer que o fervo também é luta, que a festa também é luta, porque ela é”, afirma Mário.

A socialização que ocorre nas Paradas LGBT são ainda mais importantes considerando que a comunidade tem menos espaços destinados ao lazer e diversão. “Nossas cidades não são feitas para exercer a cidadania plena. Para pessoas LGBTs, esse direito na cidade é ainda mais restrito. Portanto, quando nós dizemos que vamos fazer uma Parada de Luta LGBT em uma cidade de coronéis, em uma região de coronéis, e que essa parada vai começar numa praça chamada Praça Coronel Bertaso, isso é muito político. É resistência pura, porque nós não somos bem vindos ali, não nos querem ali e mesmo assim nós vamos lá e ocupamos, nós vamos lá fazer carnaval!”, finaliza.

Para acompanhar os trabalhos desenvolvidos pela UNA – que vão muito além da realização da Parada LGBT – basta segui-los nas redes sociais: UNA LGBT Chapecó e UNA LGBT Xanxerê.

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