
Por Renan Bernardi
Definitivamente uma das minhas bandas favoritas, o Boogarins sempre esteve distante desse menino do interior do Paraná (e hoje de Santa Catarina, mas sempre interior).
E quando você está longe de tudo que acontece no mundo da música, ver uma grande banda brasileira e uma gringa, por exemplo, parecem dois sonhos quase igualmente remotos. E no caso da Boogarins, que tem uma relevância internacional gigantesca, isso se acentua ainda mais.
Esses goianos me trouxeram um prazer de acompanhar uma banda que há muito tempo eu não tinha. De estar ansioso por lançamentos, saber o que andam fazendo, onde estão tocando, como pensam e como se comportam os membros.

Na manhã de sexta (14), quando eu e Andressa decidimos que realmente iríamos para Chapecó ver o show que o Boogarins faria no Cubo, eu já comecei a escrever esse texto na minha cabeça.
Já tinha pensando em falar que me lembro até hoje quando vi o clipe de “Lucifernandis” tocando na TV, provavelmente na extinta MTV Brasil ou em outro canal que buscava copiar este. Foi ali que eu conheci os caras e, como fã de Mutantes, já me afeiçoei ao som sessentista que a banda nostalgiava e também no vocal muito ímpar do Dinho. Vi que ali tinha muita coisa. Mas haveria mais!
Tinha pensado em falar em como Manual (2015) é um dos meus álbuns favoritos da vida e que, ao contrário do que a mídia internacional comparou, não tem nada de bossa nova. É simplesmente uma das coisas mais originais da música brasileira atual, tão original que é realmente difícil de rotular.
Tinha pensando em falar o quão incrível é o fato de uma banda brasileira com reconhecimento no mundo inteiro (coisa que já é muito rara), não se preocupar em repetir fórmula de sucesso e lançar uma coisa experimental e maravilhosa que é o Lá Vem A Morte (2017), um álbum que tem influências que para dizer que não existem, eu posso dizer que são, ao mínimo, muito improváveis.
Tinha pensando em falar tudo isso para introduzir o que seria finalmente ver o show da Boogarins. Mas isso se torna irrelevante devido o decorrer dos fatos.
Decorrer desses fatos que, se não fosse por muito pouco, teriam tirado o “quase” do título dessa matéria.
Uma semana antes do show eu fiquei sabendo que, da cidade onde eu moro, só teria como ir para Chapecó (a 80km daqui) às 23h, chegando lá à 1h20.
No momento, já desisti. Vi que seria um desperdício ir e não conseguir acompanhar o show.
A semana se seguiu e eu tentando não pensar que perderia o show de uma das minhas bandas favoritas, que tocaria tão perto de mim.
Até que chegou a sexta-feira, dia do show.
O Cadu (um dos fundadores dessa revista e morador/historiador de Chapecó) me mandou uma mensagem: “cara, você não ia vir pra chape hoje ver o show do boogarins?”
E eu respondo “pois é, cara. Eu até ia te chamar, mas acontece que o único horário de ônibus é às 23h20, eu ia chegar aí umas 1h30”
E ele me convence dizendo: “mas cara, o show deles é para começar 1h20, banda sempre atrasa… acho que dá tempo!”
Foi o estopim para me fazer repensar toda a desistência.
Comentei com minha namorada (Andressa) sobre o que Cadu tinha falado, e surpreendentemente, ela se empolgou mais do que eu com o fato de ver esse show.
Nem duas horas depois daquilo, já estava confirmando que iria para Chapecó e logo depois a Andressa já estava comprando os ingressos para o show.
Com as passagens em mãos, na rodoviária, o ônibus não chega no horário. Até aí, a gente ainda estava empolgado e esperançoso: “se atrasar meia hora, por exemplo, a gente ainda pega o show no começo…”
Ainda daria pra ver “Avalanche”, “Tempo” ainda daria pra cantar com todo os órgãos cada verso de “Doce”, de “Foi Mal”.
E passa meia hora…
E o ônibus não chega.
40 minutos, e o ônibus não chega.
00h05 foi a hora que ele chegou, eu lembro bem.
Subimos correndo e tudo teria sido um pouco mais rápido se
Não fosse uma rodoviária…
Alguém, que iria embargar no mesmo ônibus começa a bater boca com um dos seguranças do local e isso nos demora mais 10 minutos até que o sujeito entra a força no latão e seguimos viagem à Chapecó.
Cena lamentável…
Nesse momento a gente já não sabe se conseguiria ver alguma coisa do show, mas era tarde demais para dar pra trás.
Chegamos em Chapecó era 2h, mandei mensagem e Cadu me responde: “já deve ter ido umas 5 músicas”.
Tudo bem, ainda temos meio show!
Se ainda não houvesse outros problemas, claro…
O taxista não conhecia o lugar do evento e, numa procura rápida e quase desesperada, o google maps nos leva para uma região que nada tinha a ver com um local propício para um show.
Em uma segunda procura, e uma volta gigante até quase estar de volta na rodoviária, estamos no local do show. Depois de 15 minutos perdidos rondando pela cidade.
Entrando quase correndo, o segurança nos barra, sinalizando que não poderíamos mais entrar, o show já estava nos finalmentes.
Até que alguém libera nossa entrada e nos deixa entrar, mesmo sem pedir nossos ingressos!
Nessa hora de urgência em ver o show, nem me preocupei em ver quem era.
Na hora que entramos, “Lá Vem a Morte” começa ser tocada.
Improvisos vocais em meio a jam começando a emendar a canção e levá-la a lugares inimagináveis.
Que cena cinematográfica!!
Andressa vai fazendo a frente até estarmos quase em cima do palco.
E lá estavam eles…
Benke concentradíssimo nos riffs. Fefel fazendo coisas mirabolantes no baixo (que ele toca em um sintetizador) como se estivesse lavando a louça, Ynaiã me provando mais uma vez – agora, pessoalmente – que é o melhor baterista desse Brasil. E Dinho, claro! Numa musicalidade e performance que tem um nível de particularidade indescritível.
Meu deus, que banda!
Na sequência dessa, eles tocam “Onda Negra”, uma das canções mais contagiantes que eu já ouvi ao longo desses meus curiosos anos ouvindo e procurando música.
Depois dela, a banda começa a sair do palco.
Começo a rir da minha desgraça, mas já agradecido por pelo menos ter presenciado alguma coisa desse rolê que sofremos tanto para ver.
Nesse momento encontro Cadu e Ana (outra fundadora dessa revista), e conto de todo perrengue que foi pro taxista achar esse lugar. E ainda digo: “poxa, e a gente só ouvi duas músicas!”
E ele me diz: “Vai ser 3!”
Quando volto os olhos pro palco, o pedido de bis tinha funcionado!
Ele sempre funciona, claro! Mas eu já estava tão acostumado com as coisas darem errado que nem isso eu estava esperando.
E quando todos voltam aos seus instrumentos, começam o ritmo super compassado de “Lucifernandis”, a mesma canção que 5 anos antes me fez conhecer os caras que naquele momento, estavam fazendo valer a pena todo sofrimento que foi para estar ali vendo eles.
Com direito a trechos de “Auchma” e uma jam que leva o conceito de jam a nível muito maior do que simplesmente improvisar em cima de escalas, o Boogarins termina o seu show.
E que show! Quem me dera ter visto inteiro! Quem me dera um pouquinho mais.

Depois de comprar umas cervejas (a gente merecia depois de toda essa aventura), vimos que Dinho e Benke estavam ali vendendo o seu merchandising.
Compramos nossa cópia de Lá Vem a Morte e contamos nossa história para Benke, que assinou essa fofíssima mensagem no CD. Dinho se resumiu a deixar a sua mensagem “Frita muito!”. Pode deixar, Dinho.
Depois disso, descubro quem tinha deixado eu e Andressa entrar no show mesmo sem pedir os ingressos.
Meu conhecido Vini era um dos organizadores do evento, e eu com toda desatenção que me é possível não percebi que o nome de sua produtora estava estampado no topo no cartaz do evento.
Em uma conversa rápida, ele nos convida para o camarim, onde além de usufruir de outra cerveja e alguns pães de queijo, tive a oportunidade de trocar um ideia com Fefel (o presidente que realmente me representa) sobre o seu plano de governo para a eutanásia (e as liberdades individuais) e playlists para a hora da morte (Segundo Fefel, ele tocaria Velvet Underground por 12 horas, ou até enjoar… aí ele trocava). Além de receber também o seu autógrafo na nossa cópia do CD.
E acaba que esse é o release que eu tenho para esse show. Infelizmente as complicações do dia deixaram ele muito maior do que eu esperava e muita pouca fala sobre o que a banda apresentou em palco.
Pelo menos eu ainda tenho essa história para contar.
(Mas ainda preferia ter visto o show inteiro, claro).