O último ato: Temporal
O último ato: Temporal

O último ato: Temporal

Por Kaehryan Fauth

O corpo nu é poesia. O reflexo no espelho é história. A pupila dos olhos é a mais sincera amiga. O caminho não é de todo escuridão. 

O branco pálido reluz os tímidos flertes de luz que as nuvens deixam escapar. São tão delicados que sequer aquecem a pele. 

A pele, cada dia mais pálida, anseia pelo verão. Poder nadar nas águas escuras de lagos sem vida. Poder correr o risco de afundar e de ninguém mais achar. 

Sabe, eu quero acreditar… Ainda tem um mundo bonito lá fora, mesmo que as paredes atrapalhem. Ainda existem formas de falar ainda que a boca não se abra.

E eu sei que o inverno vai fazer falta também. O que mais cabe dentro de mim é saudade. E talvez a vida seja isso… Saudade. 

Tem dias que é tudo tão bonito, tem dias que o vazio entristece, e tem dias que…

Eu queria tanto te falar. 

Os relâmpagos vêm dos quatro cantos do céu, mas esses clarões pálidos já não me assustam…
Encantam… Divertem… No entanto, há muito não dão medo.

Os raios, ao longe, são coadjuvantes em ascendência querendo chamar atenção em meio a um temporal que não é feito só por eles.

A cidade aquietou – ou foi apenas minha desatenção para com o resto do mundo?

Silenciosamente, avalio – infelizmente, as varandas estão vazias. Vão perder o ato prestes a começar.

A sobriedade faz falta ao pouco juízo. O vento frio não é nada acolhedor e as gotas gélidas parecem um público alvoroçado prestes a me expulsar dali. 

Uma sincronia pulsante e triste. Uma canção de ninar para silenciar a morte.
Um embalo tímido para a solidão ancorada na caneta que falha.

As pequenas pedras de gelo precipitam e machucam o suficiente para lembrar aqueles que seguem vivos do que é sentir dor.

Os trovões são os rapsodos dessa madrugada. Acompanham os relâmpagos de modo intimidante e imponente.

No fim desse espetáculo mendigado de atenção, quem será o protagonista eleito, enfim?

O vento abraça os convidados e os conduz, brutalmente, à desesperança. É como ópio para a crença de tudo que está por vir. 

Pulei uma página. A dose foi pouca?
Estou pronta para o grand finale.

Que a despedida seja breve – e que o agradecimento seja sutil.

“And though the night sky’s filled with blackness
Fear not, rise up, call out and take my hand
Fear not this night
You will not go astray
Though shadows fall
Still the stars find their way”

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