De repente
De repente

De repente

Por Carlos Eduardo Pereira

De repente estou descendo de um ônibus voltando de um dia de trabalho, meus sapatos ficam encharcados numa poça, a água passa e molha minha meia social, e mesmo com o guarda chuva em punho, acabo tomando um banho de chuva.

Quando foi que comecei a usar meia social? Como esses sapatos foram parar nos meus pés? E o guarda chuva que eu tinha pavor, que é que tá fazendo bloqueando minha chuva? Trabalho?

Não estou mais no ensino fundamental.

De repente o fundamental é devorado pelo tempo. Fundamental era acordar cedo para ver meus desenhos repetidos. Fundamental era ser crítico (fervoroso) de novelas aos 10 anos de idade, principalmente as que não valiam a pena ver de novo. O que valia a pena ver de novo era o que vinha depois: o grande dragão branco, os animais falantes, os “irmãos” perdidos em uma ilha, os policiais pra lá de atrapalhados, a paz do coração de um dragão. Fundamental mesmo era correr pra ver um colorado, mesmo sendo gremista. O cara era astucioso!

De repente eu estou usando as mesmas meias que um dia dei risada quando vi meu pai usando. Os sapatos então… Eu ainda imagino meu pai de All Star. Eu ainda quero o mingau da minha mãe. Fiquei 18 anos da minha vida esperando minha barba crescer. Vou lembrar pra sempre da primeira vez que me disseram que tinha uma migalha de pão na minha barba. Barba serve pra guardar comida.

Hoje eu durmo em qualquer lugar.

Mas ainda tenho medo do escuro. Posso dormir contigo?

Mas, hey, mãe!
Por mais que a gente cresça
Há sempre alguma coisa que a gente não consegue entender

Por isso, mãe
Só me acorda quando o sol tiver se posto
Eu não quero ver meu rosto
Antes de anoitecer – Humberto Gessiger

Estamos livres do passado, estamos presos ao futuro.

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